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Foto do escritorGoretti Giaquinto

Uma Ajudinha dos Santos


Imagens: Arquidiocese de picos, gerada por AI e ajustadas no Canva


Sou funcionário de uma empresa multinacional. Não entrei na vaga especial: optei por entrar através do meu currículo, passando por todas as etapas assim como os demais candidatos. A diferença entre mim e eles era apenas... uma cadeira. A minha, de rodas. Não a de rodízios, que há aos montes nessa empresa e em outras. A minha tem rodas grandes, que uso pra me deslocar, em casa ou fora dela.


Mas não estou aqui pra falar de mim, e sim, de uma colega da empresa. Participamos juntos de todas as etapas para esse job, e ambos fomos aprovados. Quando entrei eu tinha 24 anos, ela era só um mês mais nova. Uma figura. A começar pelo sotaque. Uma nordestina no meio de paulistas. Tipo: ôxe, vixe e tu visse. Uma figura porreta. Como ela mesma dizia, uma mulher arretada.  


Sempre que nos encontrávamos, dávamos muitas risadas, e ela ia me atualizando das diferenças culturais. Parecia que morávamos em países diferentes! Palavras que nunca ouvi desfilavam por ela no tom doce e arrastado da sua voz. Era engraçado ouvi-la contar as histórias de sua vida. Muitas, hilárias, principalmente pelo tanto que deu errado. E ela não se avexava em contar. Desfilava as palavras numa cantata que me enfeitiçava.


Uma das histórias, que ela gostava de contar pra todo mundo, era das adivinhações que fazia quando morava no interior do nordeste. No mês de junho, por lá, há diversas tradições folclóricas ­e simpatias casamenteiras.


— As solteiras, com suas curiosidade da bexiga — explicava ela — buscam os santos para brecharem o nome dos futuros pretendentes. Confiam na ajuda divina para encurralarem os três santos fortes que têm dias a eles dedicados: Santo Antônio (13/06), São João (24/06) e São Pedro (29/06). As simpatias são de diversos tipos, e devem ser realizadas na véspera do dia dos santos, às 18 horas ou meia-noite.


Perguntei por que, e ela não soube responder. Mas me confidenciou que, desde adolescente, fazia as adivinhações. E que os santos sopraram vários nomes. Perguntei se encontrou algum deles, se deu certo.


Tu acha? — respondeu, complementado — ainda não me mostraram o nome verdadeiro da tampa da minha panela.


Recentemente nos encontramos no corredor do café. Estávamos em julho, e eu arrisquei a pergunta, na leseira do momento — confesso que já estava me apropriando de alguns verbetes dela, que nunca maldava minhas constantes perguntas. E eu, nunca me sentia morgado na sua presença.


— Qual o nome da vez, pelo menos houve consenso entre os santos? — perguntei.

— Então, bichinho — ela desconversou, com sorriso misterioso e o apelido carinhoso que tratava todos.

— Qual a simpatia que você fez?

— Enterrei uma faca na bananeira perto de casa — respondeu — à meia-noite. Quase levei bala, não pensei que o vizinho estava acordado — e desatou a rir, mangando de si mesma.

— E a faca falou o nome? — perguntei, a curiosidade lá em cima.


Ela pegou o celular e me mostrou a foto, sorrindo e com olhar inocente. Sem entender o sinal, virei os olhos para a foto, enquanto ela explicava:


— A seiva da planta foi pirangueira, só desenhou a letra F, você consegue enxergar?


Agora era eu sorrindo de volta. Meu nome começa com F. O coração numa zoada só.


Desafio #18: Dia do Riso.

Goretti Giaquinto

PS: se não conhecerem algumas palavras, que tal gogglar?

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1 Comment


Stela Alves
Stela Alves
Feb 08

Adora a pronuncia e as histórias, lendas que chega do Nordeste. Se bem que, sou paulista paulista, e qdo criança tb fazia essas advinhaçoes para saber o nome(letra) do felizardo. Não lembro de nenhuma. Mas pouco importa sou divorcida

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