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Foto do escritorGoretti Giaquinto

Ídolo-parente? Quase...


Cantor num show, década de 70, fãs aplaudindo
Época em que, sem o celular, o show era mais curtido (Imagem IA/DALL-E 3, ajustada no Adobe Express)

Tinha um Cardoso no sobrenome. Como vários brasileiros devem ter. Mas a mãe, sonhadora, espevitada, cismou que um cantor famoso era parente, e a levou ao estádio onde o show ia acontecer. Anos 60/70. O ídolo era venerado pelas fãs, das adolescentes às mais velhas — olhos castanhos que encantavam e arrancavam suspiros.


Shows eram raros na cidade, e de famosos, então… Época de long-plays, de discos vinílicos que mudaram de rotação até chegarem às fitas-cassetes, precursoras dos CDs, bisavós dos atuais streamings. Ir a um show presencial era coisa de quem tinha um pouco de mais poder aquisitivo, inclusive pra comprar as músicas de seus cantores prediletos.


Era sua primeira vez num show, no local onde milhares se espremiam pra cantar as músicas entoadas de cor, com gritos por cada olhada dele, do palco longínquo, como se interceptado por cada uma que chorava pela emoção do encontro.


A adolescente foi mais pela promessa de conhecer o parente famoso. Envolvida pela história afirmada pela mãe, que jurava verdade. Não gostava de tumulto, de gritos e, muito menos, de faniquitos exagerados das fãs fingindo desmaios. Mas, até que era emocionante ouvir o cantor ao vivo. Afinal, era um evento para poucos!


Aguardava a promessa de ir ao camarim, ao final, e pegar um autógrafo do ídolo-parente. Acreditava piamente na mãe — o suficiente pra suportar o barulho infernal a que não estava acostumada. Em que fria me meti ... ou me meteram, pra ser sincera — pensava. Restava aguardar o final do show; a mãe disse que iram falar com o tal parente famoso, o cantor que fazia as moças sonharem.


Finalmente, o show acabou. E lá foram as duas, pra o tal camarim. Até se empolgou, poderia descolar uma foto autografada, com dedicatória íntima. Seria legal mostrar no colégio, iam morrer de inveja dela. O caminho não tava tão livre, muitas fãs tinham a mesma intenção — a de arrancar um beijo exclusivo e declarar seu amor ao ídolo. Não estavam dispostas a deixá-las furar a longa fila. A mãe, confiante, ia explicando a preferência, o parentesco próximo. Ia dando certo.


Chegaram depois de alguns minutos à porta do camarim. A mãe encarou o segurança, um leão de chácara de braços cruzados, rosto impassível. Explicou, deu o nome e sobrenome que indicava o parentesco, mas não houve jeito. O moço nem piscou para o não.


Só ela acreditou que tinha parente famoso. Quando chegaram em casa, a verdade apareceu, nua e crua. Afinal, o sobrenome era o mais comum da cidade. Do estado. De um Brasil colonizado por sobrenomes comuns a vários países, espalhados Brasil afora, sem, necessariamente, um parentesco direto. Quiçá beemmmmm indireto, lá pela centésima geração.



 

Goretti Giaquinto

Desafio #95 de 365

Tema: Rôlezin com ídolos

Um conto que traga: um lugar + um ídolo/a seu

Insira neste conto 2 situações: 1 constrangedora + 1 emocionante

Caracteres livres

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2 Comments


Eu achava que eram verdes, mas o Google disse que eram castanhos...

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Olhos castanhos ou verdes? Lembro de ter ido lá…

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